quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Andam falando por aí do homem contemporâneo. Ninguém me entrevistou. Deus está morto, eu concordo. Freud também. O Estado. A filosofia. Dizem da fragmentação do eu, deixem eu me apresentar. Geminiana, terceiro decanato, nascida antes da constituição de 88 e depois do surgimento da Xuxa.

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Não conheci o Lamarca, não quis o fim da ditadura. Não pintei a cara, não comprei nenhum manifesto antropofágico. Compro cds pirata, baixo discografias completas na internet. Vejo graffitis nas ruas e já distinguo o traço de alguns artistas. Não uso brincos nem pulseiras, meu celular custou 50 reais. No ônibus, só sento na cadeira do corredor, escondo dinheiro no meu sutiã. Ando rápido pelas ruas do Centro, vou à Lapa suja fingir que comemoro a boêmia do carioca, como num podrão temerosa do mundo invisível dos organismos, jogo latinha na rua, bondade com o catador.

Ouço defenderem pena de morte pra arrastadores de crianças pelas ruas da cidade, vejo bandidos políticos reeleitos. O sistema partidário é que é o problema. Lan Houses em favelas, pescoços de crianças com cartões magnetizados pendurados. Motoristas de ônibus não param no ponto e sorriem do poder que têm. Os ricos fazem yoga, análise e pilates. Os pobres fazem churrasco no bar da esquina e compram tvs de plasma em 50 vezes.

Na cadeira da faculdade, vejo falarem sobre mim e meu tempo. Só desconstrução, foi só isso que aprendi. Minha religião é fruto do positivismo europeu do século XIX, racional até o cú. Jesus ninguém sabe se existiu ou se fez o que seus não-contemporâneos evangelistas disseram. Nosso Estado se sustenta da despolitização. Nossas leis feitas pela Coca-Cola, Usineiros de Alagoas S/A, Latifundiários do Pará não são sequer o que estão escritas. Depende do humor do juiz, da linha filosófica que ele, do tempo em que se tinha uma, segue.

Todos são corruptíveis e tentar não ser pode jogar-me fora do sistema. Sou brasileira. Estou presa na rede relacional que passa pessoas na minha frente na fila da boate, estudantes menos competentes ganham as vagas de estágio a que concorro, tenho aula com professores cretinos que cagam para ensinar. Preciso bajular. Se me indigno, sou mal amada. Quero acreditar que posso mudar alguma coisa, mas a força da cultura, mantedora, me oprime. O Renan Calheiros acaba de ser absolvido. Minha amiga, advogada, me conta de uma desempregada presa por roubar uma lata de leite. Jornalistas trocam palavras para que caibam no espaço de um título 3x52, trabalham 12 horas por dia, ganham 2 mil reais por mês.

Peguei onda hoje cedo. Chorei dentro do mar.

9 comentários:

Flávia Feijó disse...

Amiga..sem palavras..
o texto tá FODA demais!
Incrível..

Zeh disse...

A apatia frente a essas questões sócio-políticas seria um mal estar experimentado pelo homem contemporâneo? Ou essa seria exclusividade dos nascidos na terra brasilis?
A resposta não sabemos.
O certo é que poucos, pouquíssimos, fogem à regra, ao comum. Você é um deles.
Não tenho orgulho de ser brasileiro... Mas, obviamente, tenho orgulho de ter à minha volta pessoas assim, como você. Numa terra sem pudores, sem valores, sem ética, exercer - de alguma forma - a cidadania é tarefa árdua.
Texto simplesmente incrível.

Anônimo disse...

Olha, tava passando por aqui e tenho q concordar com os comentarios acima: VC REALMENTE TEM TALENTO! De verdade. Parabens pelo texto!

Flávia Feijó disse...

Hoje mesmo eu e Zé conversávamos sobre a apatia das pessoas. Tudo acontece e ninguém faz nada. Minha mãe mesma me disse: no meu tempo as pessoas iam para as ruas, protestavam. Hoje, ninguém faz nada. Fechamos os olhos simplesmente...preferimos nos alienar. Eu atribuo grande parte disso à pós-modernidade: aquela filosofia do cada um por si.
Muito triste tudo isso...

Unknown disse...

Mto foda mesmoooo
mas soh um detalhe
realmente n tem mto a ser feito

Anônimo disse...

Vc é minha aposta.

Unknown disse...

Rosa, como n�o tive tempo essa semana para falar com voc� e, pelo visto, o mesmo se passou contigo, deixo as primeiras notas aqui, mas como sugeri, preciso falar com voc� sobre seu blog.O Estado n�o est� morto. Menos ainda a filosofia. N�o sei ainda qual � a sua inten�o com o Blog, mas caso deseje algum rigor, algum compromisso com a teoria, precisa cuidar muito o que diz. Sem nenhuma prepara�o, sem nenhuma entrada, voc� sepulta o Estado ea Filosofia. Mas e os argumentos em favor das afirmativas? O Estado est� corrompido, mal-liderado. Isso fica muito longe de morto. A filosofia, morta? Marx, Nietzsche e Hegel fazem um esfor�o enorme no s�culo XIX para salvar a filosofia e agora ela simplesmente falece? Ah, isso faz tempo...Mas e Heidegger e Bachelard? Esses se foram h� 30 anos, apenas. Sugiro ir al�m da descontru�o e da fragmenta�o. Isso � conversa liberal, recheadinha de ideologia conservadora. Pense numa objetividade em permanente constru�o e sempre aberta, flex�vel. Apontar contradi�es na sua personalidade n�o vai mais longe do que uma simples descri�o. Assim voc� se comporta como o historiador. Ele acumula fatos, descri�es. Mas o fato n�o muda o historiador. Ele n�o transforma o fato em id�ia. O fato n�o muda toda sua organiza�o mental. Fa�a dos fatos id�ias, inserindo-os num jogo complexo de raz�es...Se voc� n�o vai � Lapa porque gosta, n�o engane a si mesma para andar em grupo, isso � fraqueza. Nos ensinaram que temos de ser siceros com os outros, assim n�o seremos considerados mentirosos. Mas nos ensinaram errado. Temos �de ser sinceros com n�s mesmos, pois assim n�o ca�mos em contradi�o. Se voc� tem nojo do podrao, coma no Gero sem vergonha nenhuma, pois o cara que inventou os pratos de l� n�o tem a menor culpa do mundo ser capitalista. Ele quis criar o belo para a alimenta�o. O que fizeram disso � outra coisa...O sistema partid�rio n�o � o problema. Nesse caso falta teoria pol�tica para voc� perceber a apropria�o e deturpa�o que fizeram da palavra democracia. Primeiro, fazendo-a parecer uma coisa boa, segundo, escorando-se nela para agir livremente.

Anônimo disse...

Após ler um texto tão brilhante quanto o seu, me preocupa a minha "falta de palavras" sobre o tema. Ficamos tão passivos com todo o "lixo" da nossa geração que nos tornamos apáticos frente a vida. Seres individualistas preocupados com seus próprios umbigos.
Que merda tudo isso cara!! que merda me sentir uma merda por não saber ao menos como começar a mudar alguma coisa! Poder ao menos mostrar minha indignação com tudo o que vc disse. Sim, eu fico e sou indignada com tudo que vc disse, eu juro!! Mas como falar disso? como mostrar isso?
Por isso seu texto é brilhante. Ele consegue falar, brigar, esculachar, ensinar, ironizar, sacanear todo esse "lixo" que partilhamos consciente ou inconscientemente.
Bom... acabei de fazer uma catarse nesse blog e confesso que isso foi mto bom p/mim... espero que p/vcs tb! rsrsrsrs... bjocas
Bjocas

Lernanto disse...

http://ogerente.com/congestionado/2007/03/06/como-fazer-amigos-e-influenciar-pessoas/